quinta-feira, 25 de abril de 2013

2014, a Copa que o Brasil já perdeu


Por Thiago Arantes, 

O Brasil será o grande derrotado na Copa do Mundo de 2014. Esqueçam esquemas táticos, análises técnicas, convocações, gols ou arbitragem. A derrota não virá numa zebra nas oitavas de final contra a Bélgica, num duelo épico de quartas contra a Itália, numa semifinal angustiante contra a Espanha ou num Maracanazzo reloaded contra a Argentina.

A derrota já veio. O Brasil perdeu a Copa de 2014. 



O Brasil perdeu, leiam bem. O que vai acontecer com a seleção brasileira é outra história. Uma história que muda pouco o que realmente importa. O Brasil perdeu a Copa de 2014. 

Um evento como a Copa é a chance de um país mudar, se redescobrir, sanar problemas e construir soluções, mesmo que seja sob a fajutíssima desculpa de "o que o mundo vai pensar da gente se não estiver tudo dando certo?". Que seja, dane-se a pequenez da desculpa, desde que sejam construídas estradas, linhas de metrô, corredores de ônibus, elevadores, hotéis, e, vá lá, até um ou outro estádio.



A Copa do Mundo é, para os tempos de hoje, o que foram as tais "Exposições Mundiais" no século 19. Era preciso se arrumar para receber visitas em casa. 

Mas o Brasil hoje corre para retocar a maquiagem, empurra a vassouradas a sujeira para debaixo do tapete, tranca os cachorros pulguentos na despensa e manda a criançada dormir mais cedo, porque sabe como é criança quando chega visita, desanda a falar cada coisa...

Faltam pouco menos de dois meses para a Copa das Confederações, e o estádio da final não está pronto. Aquele estádio na Zona Norte do Rio, que foi erguido no lugar do Maracanã ao preço mirabolante de 1 bilhão de reais; e que terá de ser reformado para a Olimpíada. 

(Aqui, um parêntese: todas as reportagens sobre estádios da Copa têm a obrigação de falar quanto custou e quem financiou a obra; isso é utilidade pública, antes de mais nada).

Faltam menos de dois meses para a Copa das Confederações e nenhum aeroporto teve reformas significativas concluídas. Pouco mais de um ano para a Copa do Mundo e os taxistas que falam inglês continuam a ser uma raridade, as placas de trânsito seguem indecifráveis para estrangeiros, os hotéis e vias públicas não vão dar conta do recado, obras de mobilidade urbana de Manaus, Brasília e São Paulo não ficarão prontas - umas foram canceladas, outras postergadas, todas custaram irreversíveis milhões e não é difícil adivinhar quem pagou a conta.



A um ano e dois meses do começo da Copa, o presidente do Comitê Organizador Local está cercado por denúncias, e não é para menos. José Maria Marin, o homem que gere a operação Copa do Mundo no Brasil, passou seus mandatos de deputado bajulando delegados ligados às torturas da ditadura, superfaturou a sede da CBF, negociou apoio na aprovação de contas da confederação dando cheques a seus eleitores. 

Enquanto isso, o secretário-geral da Fifa, Jerome Valcke, diz que a organização da Copa do Mundo no Brasil seria mais fácil se o país fosse menos democrático e tivesse menos esferas de governo, legal é a Rússia, que tem um poder centralizado e menos palpiteiros. 

A organização da Copa do Mundo seria mais fácil, monsieur Valcke, se ela estivesse nas mãos de gente diferente. 

De gente que não estivesse interessada apenas em sugar dinheiro do país com o benefício de isenção de impostos. A organização da Copa do Mundo seria mais fácil se ela fosse feita para, de fato, deixar o país com algumas pequenas vitórias em áreas que vão muito além do campo de jogo. 

O Brasil de Felipão, de Neymar, de Ronaldinho ou Kaká, o Brasil pentacampeão, seja com volantes classudos ou brucutus, pode ganhar ou perder a Copa de 2014. 

O Brasil de 200 milhões de pessoas, aquele que acordará no dia 14 de julho de 2014 para trabalhar, este sairá da Copa derrotado. Qualquer que seja o resultado da final.

sexta-feira, 19 de abril de 2013

Por que dizer não à redução da maioridade penal?


Por Thelma Alves de Oliveira
Sempre me pergunto, assim como você, o que é preciso fazer para reduzir a violência, proteger as crianças e criar um mundo melhor para se viver. Confesso que nesta reflexão algumas coisas me incomodam muito.
Todos os dias morrem meninos por este Brasil a fora, vítimas da violência. Eles são negros, pobres, moradores de territórios violentos, expostos cotidianamente a atos e fatos violentos. Ninguém fala deles. Ninguém se mobiliza para interromper essa violência tamanha?! Por que esta invisibilidade?
Dados do DATASUS/Mapa da Violência apontam que em 2012 no Brasil 26.854 jovens entre 15 a 29 anos foram vítimas de homicídios (53% do total). Destes, 74% eram negros e 91% do sexo masculino. A violência tem endereço.
Cada vez que ouvimos uma notícia de morte de uma criança ou jovem, ou ainda, quando estes são autores de homicídio vem o desconforto, a inquietude e a indignação. Isso não é natural, não é aceitável, não devemos nos acostumar com essa realidade. Quando isso ocorre é como se a humanidade perdesse junto sua força, sua crença, sua esperança. Essa dor se espalha por tudo e alcança a todos. Essa “doença” se instala de uma forma avassaladora e os “remédios” parecem fracos, ultrapassados e sem efeito. A sensação de impotência avança, o desespero toma conta e soluções fáceis enganam. Propagadas sem reflexão vão criando falsas ilusões. Neste contexto, alguns defendem a redução da maioridade, imaginando que com isso se interrompe o ciclo das violências, ou ainda, pensam apenas em punir para ensinar. A motivação pode ser legítima, mas a solução é ilusória. Observem algumas consequências negativas.
Reduzir maioridade significa encarcerar os adolescentes junto com os adultos em prisões fétidas, superlotadas, em guerra cotidiana e silenciosa, chamadas de escolas do crime. Sem estudo, sem trabalho, sem profissionalização. Com perspectiva de saírem menos cidadãos do que entraram. Isso não pode ser saída, ou seja, apostar num sistema falido.
Reduzir maioridade significa condenar duplamente aqueles que já vivem em ambientes violentos. Crianças que crescem em ambientes desprotegidos, sem exemplo de cidadania, aprendem rapidamente a responder conflitos com agressões, usando o comportamento anti-social como escudo.
Lembrem-se: crianças aprendem rápido e fácil. A responsabilidade de ensiná-las é nossa: dos adultos pais, professores, vizinhos, amigos, autoridades.
Reduzir maioridade penal significa reduzir perspectivas de futuro para quem ainda tem chance de aprender a refazer seu caminho. Está provado que os jovens precisam de sonhos que inspirem projetos de vida. Precisam também de apoio e limite. De construção de autonomia. De oportunidades concretas para aprenderem a ser e a conviver. Isso também é responsabilidade nossa, dos adultos.
Reduzir a maioridade significa o castigo do Estado ausente, inoperante e violador de direitos que depois de errar entra para punir. Quando um ato infracional é cometido por crianças ou adolescentes já falhou a Família, o Estado e em certa medida a Sociedade. A família que por um lado não foi suficientemente protetora e educadora. O estado que não entregou políticas públicas de educação, saúde, cultura, esporte, lazer, profissionalização, moradia, alimentação, enfim, não garantiu direito básico algum, muitas vezes nem aos pais e nem aos filhos. E ainda, a sociedade que praticou, e portanto, veiculou valores do consumismo, individualismo, hedonismo, imediatismo e outros “ismos” da modernidade, que só contribuem para aumentar a violência cotidiana e sistêmica, transformando a vida num espetáculo de inconsequências.
Idéias repressoras se expandem na proporção do crescimento da violência. Responder as tensões sociais produzidas pela desigualdade e exclusão social e pelo confronto da riqueza e pobreza, que divide em dois mundos, duas infâncias adolescentes distintas com mais repressão não resolve, simplesmente porque o jogo é desigual e o pior alcança sempre o mais fraco. Este não é um movimento novo na história.
Mais repressão não é remédio, nunca foi e nunca será. A restrição do acesso aos bens culturais, escassez de boas escolas, pífias ofertas de formação profissional, e ainda, a quase absoluta ausência de espaços de lazer e cultura, fazem parte da vida empobrecida e destituída de valor da maioria dos adolescentes que respondem medidas socioeducativas hoje. Neste sentido é preciso inverter esta lógica. Educar mais para punir menos. Criar mais oportunidade para excluir menos.
Para seguir na argumentação será preciso estabelecer um consenso mínimo: ninguém aqui concorda ou defende os atos infracionais ou comportamentos antissociais praticados. Pelo contrário, estes devem ser evitados, prevenidos, e não sendo possível impedi-los, deve haver responsabilização adequada.
Outro consenso necessário é de que devemos buscar resultados semelhantes: menos violência, mais segurança, mais direitos garantidos, mais cidadania a todos.
Considerando estas premissas vamos a outros argumentos para demonstrar que reduzir a maioridade penal não é solução. Praticar a lei sim.
Sinase
A responsabilização do adolescente é assegurada pela Lei nº 12.594/2012 que instituiu o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo – SINASE, e previu 03 objetivos para as Medidas Socioeducativas: a responsabilização do adolescente; a integração social, garantia dos direitos individuais e sociais e a desaprovação do ato infracional. Portanto, a lei colocada em prática implicará num processo educativo ao invés de punitivo simplesmente. Onde deverá combinar apoio e limite, ensinar a consequência dos atos e preparar para o retorno ao convívio social em novos padrões. Isso tornado realidade pode mudar o rumo das coisas.
Nem o Estatuto da Criança e do Adolescente e nem o SINASE estão sendo praticados na íntegra pelos programas municipais e estaduais, portanto, não há como avaliar a efetividade da legislação, uma vez que seu cumprimento é parcial. Para que isso aconteça os estados e municípios devem investir numa política de atenção ao adolescente em conflito com a lei de forma clara e consistente, ao mesmo tempo em que devem ampliar as políticas básicas, criando um ambiente inclusivo, protetivo e educativo, com consequências preventivas à violência para todas as crianças, adolescentes e jovens, em especial, para aquelas que dependem quase exclusivamente do Estado para isso.
Por fim, proponho substituir a discussão sobre redução ou não da maioridade penal pela implantação do SINASE, numa demonstração de coragem e aposta no futuro. E neste cenário explicitar a sociedade que queremos deixar para nossos filhos, ou melhor, que queremos construir junto com eles. Um lugar onde ninguém tenha que se esforçar para exercer um direito, para requerer igualdade, onde a desigualdade incomode a todos os desiguais. E ainda, onde todos tenham a coragem de desejar para os filhos dos outros aquilo que desejam para seus filhos. (inspirado na compreensão de uma mãe da Vila Torres sobre o ECA).
Curitiba, 14/04/2012 Thelma Alves de Oliveira - ex-secretária da Criança e da Juventude do Paraná, psicóloga e professora de Educação Física, com especialização em psicodrama e gestão pública. Foi diretora-técnica da Fundação de Ação Social do Estado do Paraná (Faspar), instituição que originou o Instituto de Ação Social do Paraná, e a primeira secretária executiva do Conselho Estadual da Criança (Cedca), em 1994, órgão que presidiu por duas gestões, entre 2005 e 2008. Ocupou a vice-presidência do Fórum Nacional dos Gestores do Sistema Socioeducativo, em 2008.
Lá se vai o menino cedo demais
Thelma Alves de Oliveira
Criança na rua, desprotegida - da - vida
sem o cuidado dos pais ocupados
em sobreviver, em comer, em prover
o pão de cada dia para suas crias

Sem rumo vai por aí o garoto
que deixou a escola e agora esmola

Coração de mãe apertado lamenta:
Cadê meu guri que saiu por aí
solto, roto, que nem se aguenta

Pensamento agitado do menino apressado
Prazer imediato- dinheiro exato
Futuro por perto - sem rumo certo
Assim ele vai ...
Vasta armadilha- escassa saída
Assim ele fica!

Cenário demente que vende gente
Que expõe criança e adolescente
Por preço barato que não rende

Assim a violência se faz
E desprotegido mais uma vez
Lá se vai o menino cedo demais

Essa história termina mal
Sem valor foi a vida desse tal
Que vítima e autor de infração
fez sofrer e de nada valeu
viveu muita dor e ponto final. 











sábado, 13 de abril de 2013

A Educação Proibida



Pessoal esse é o filme sugerido na oficina de hoje, 13/04. Na verdade, trata-se de um documentário sobre as atuais condições de ensino e das suas possíveis superações.

Gostaria de sugerir a vocês uma reflexão sobre o assunto discutido no documentário relacionando-o com os temas que trabalhamos nas nossas oficinas (sobre o que é conhecimento e as transformações que ocorram na sociedade na passagem da sociedade medieval para a sociedade moderna). Feito isso, vocês podem escrever suas considerações em uma folha e entregar se preferirem assim.

quarta-feira, 3 de abril de 2013

Receita de redação


por Cristovão Tezza

Virou piada nacional a redação do Enem que, incluindo uma receita de miojo entre a introdução e a conclusão, acabou aprovada pelos corretores. Esse é um tema que assanha o humor nacional – na terra de analfabetos letrados e iletrados, rir alto da desgraça alheia, aluno ou professor, é o melhor remédio.
Antes, porém, de atacar o aluno debochado, os corretores, o método ou a logística do Enem, seria bom voltar os olhos a esse dinossauro didático das aulas de Português que vem resistindo há séculos como exemplo cristalino do texto ornamental ou linguagem inútil: a célebre “redação escolar”. É um gênero que não serve para rigorosamente nada, e não tem nenhum uso concreto na vida real do estudante – dá-se um tema, com ou sem texto de apoio, o que é irrelevante, e convida-se a vítima a “desenvolver” três ou quatro parágrafos sobre ele.
Nascida para “tirar nota”, a redação escolar é um convite irresistível ao lugar comum, ao chavão, à frase feita, à platitude. As frases se emendam sem rumo, em direção à mágica última linha, que dará fim ao suplício e, com sorte, uma boa nota. A prova de redação nunca sabe o que quer avaliar – fala-se em “concatenação de ideias”, “adequação ao tema”, ou algo esotérico semelhante, e depois contam-se os erros ortográficos, como quem cata milho no texto, de onde sai uma nota rezada mais pela apreensão intuitiva do conjunto que por qualquer cálculo específico. A “redação escolar” é uma herança retórica de um tempo em que uma velha “arte literária” pautava a suposta qualidade do texto. Foram-se os ornamentos, mas ficou o modelão encarquilhado que inferniza a vida dos alunos em milhões de testes de escolaridade pelo país afora.
O que se quer avaliar? Ora, o domínio que o aluno tem da língua padrão do português escrito no Brasil, o que inclui um conjunto bastante complexo de habilidades, indo da capacidade de leitura, pressuposto fundamental, às ferramentas técnicas da frase escrita (coesão entre as partes, uso de relatores, adequação vocabular etc.). Não são as “ideias”, essa nuvem vaga e sem contorno que costuma alimentar a “redação escolar”, o que de fato interessa, mas o domínio técnico da escrita. E, para que tal avaliação seja minimamente objetiva, é preciso implodir o velho modelo. Pedir a um estudante que escreva um resumo em 50 palavras de um texto de duas páginas dirá muito mais sobre a sua competência que 30 “redações escolares”. Uma resposta em um parágrafo a uma questão específica sugerida por um texto ou uma imagem exigirá mais e melhor dele que três parágrafos de encheção de linguiça. Ou de uma receita de miojo – tanto faz.
A propósito: a melhor prova de Língua Portuguesa do Brasil vem sendo feita pelos exames da Universidade Federal do Paraná há mais de uma década. Não faria mal o Enem dar uma olhada no nosso modelo.